Reportagem aponta aumento dos casos de intolerância religiosa no Rio de Janeiro

Reportagem do RJTV da TV Globo, do dia 12/12/2018, aponta que houve aumento de 51% do número de casos de intolerância religiosa no Rio de Janeiro. Segue abaixo alguns trechos da reportagem:

“De janeiro até a primeira semana de dezembro, há registros de 103 casos de intolerância religiosa no Rio de Janeiro. Em 2017 foram 68 casos. Um aumento de 51% de acordo com a secretaria estadual de Direitos Humanos.”

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“Muitas vezes, os atos que nós percebemos aqui é em decorrência das vestimentas das pessoas. Começa com um olhar atravessado. O segundo passo, muitas vezes, é uma palavra colocada de puro preconceito”, explicou Átila Alexandre Nunes, secretário estadual de Direitos Humanos.

“As mulheres são as maiores vítimas da discriminação: 47%. Uma parte dessa perseguição é imposta pelo poder paralelo. Os traficantes também passaram a interferir nas questões religiosas.”

Fonte: <https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2018/12/12/aumenta-em-51-o-numero-de-casos-de-intolerancia-religiosa-no-rj.ghtml>.

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O Coletivo por uma Espiritualidade Libertária lançou o primeiro número do informativo Diálogos & Espiritualidade (2017) que aborda a questão da intolerância religiosa. Esta publicação está no âmbito das atividades da Campanha Contra a Intolerância Religiosa e do projeto Diversidade Religiosa em Sala de Aula. Para saber mais sobre a Campanha Contra a Intolerância Religiosa, leia o texto “É preciso dizer não à intolerância religiosa no Brasil” de Amauri Alves e Silas Fiorotti. E para saber sobre o projeto Diversidade Religiosa em Sala de Aula, leia o texto “Por que falar de religião em sala de aula?” de Silas Fiorotti.

Receba gratuitamente o ebook “Anarquia cristã” de Vernand Eller

O livro Anarquia cristã: a supremacia de Jesus sobre os poderes, do teólogo Vernand Eller, foi publicado originalmente em inglês, em 1987. Este livro foi traduzido ao português pelo Filipe Ferrari, membro do Coletivo por uma Espiritualidade Libertária, e foi publicado integralmente na revista Espiritualidade Libertária (ver link).

Agora o Coletivo por uma Espiritualidade Libertária disponibiliza também o ebook (.epub) com o conteúdo integral do livro e com uma introdução redigida pelo tradutor. Preencha o formulário e receba o ebook por email.

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Para maiores informações sobre o Coletivo por uma Espiritualidade Libertária e sobre a revista Espiritualidade Libertária, ver: <espiritualidadelibertaria.com>.

Membro do Coletivo por uma Espiritualidade Libertária defende tese na USP

No dia 06 de março, Silas Fiorotti, membro do Coletivo por uma Espiritualidade Libertária, defendeu tese de doutorado em Antropologia Social na Universidade de São Paulo (USP). A tese, intitulada A Igreja Universal e o espírito da palhota: análise dos discursos “religiosos” e “políticos” da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) no sul de Moçambique, em breve estará disponível na Biblioteca Digital de Teses da USP.

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Silas Fiorotti coordena o projeto de extensão Diversidade religiosa em sala de aula do Coletivo por uma Espiritualidade Libertária. Para saber mais sobre este projeto, leia os textos “Por que falar de religião em sala de aula?” e “Qual deve ser o lugar da religião na educação básica?

No dia 01 de fevereiro, ocorrerá o evento “Diálogos Emergentes – Juventudes e Religião”

No dia 1 de fevereiro a partir das 14h, ocorrerá o evento “Diálogos Emergentes – Juventudes e Religião”, no auditório do CENPEC, aqui na cidade de São Paulo. Compareçam!

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Venha debater conosco questões que têm impactado a vida de jovens em grandes centros urbanos na constituição de suas crenças, relações sociais e subjetividades na relação com as religiões. Para isso, o Programa Jovens Urbanos convida especialistas que têm pesquisado e desenvolvido ações em diálogo com as temáticas e as questões juvenis.

O evento é gratuito, só é solicitada a confirmação da presença no formulário que pode ser acessado no link: http://bit.ly/2DnW3Rn.

Campanha Contra a Intolerância Religiosa (2018)

O Coletivo por uma Espiritualidade Libertária promove anualmente a Campanha Contra a Intolerância Religiosa. Leia o texto “É preciso dizer não à intolerância no Brasil”, e saiba mais sobre nossa campanha.

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Utilize a hashtag #nãoàintolerânciareligiosa e deixe sua foto e seu recado nas redes sociais, por uma cultura de respeito, convivência pacífica e livre da intolerância religiosa. Você pode acessar os cartazes da nossa campanha através deste link.

Você também pode promover a Volta às aulas sem intolerância religiosa na sua escola, incentivando seus colegas professores e estudantes a participarem da Campanha Contra a Intolerância Religiosa.

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O Coletivo por uma Espiritualidade Libertária lançou o primeiro número do informativo “Diálogos & Espiritualidade” (2017) que aborda a questão da intolerância religiosa. Esta publicação está no âmbito das atividades da Campanha Contra a Intolerância Religiosa e do projeto “Diversidade religiosa em sala de aula”. Para saber mais sobre a Campanha Contra a Intolerância Religiosa, leia o texto “É preciso dizer não à intolerância religiosa no Brasil” de Amauri Alves e Silas Fiorotti. E para saber sobre o projeto “Diversidade religiosa em sala de aula”, leia o texto “Por que falar de religião em sala de aula?” de Silas Fiorotti.

 

2018 com espiritualidade que vai contra toda a injustiça!

Nós do Coletivo por uma Espiritualidade Libertária desejamos um 2018 cheio de espiritualidade que vai contra toda a injustiça!

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“Clamem, mães da dor e da esperança. Não deixem de clamar através dos séculos, mães de Ramá e de Belém. Com as mães do Iraque e de Gaza, e novamente de Belém. Com as mães de Auschwitz ou da Armênia, e de todos os genocídios da insensata história humana. Gritem e chorem com as mães de todos os nossos povos da América indígena, dizimados em suas próprias terras pelo afã homicida do conquistador atirado na busca do ouro e do poder. Gritem com as mães de Soweto, com as de Hiroshima, as milhões de mães de holocaustos de inocentes, que a soberbia e o preconceito disseminam em nossa história. Com as mães de Biafra e do Haiti, vendo seus filhos morrendo na fome imposta, na miséria calculada. […] Que seus gritos de espanto ressoem sempre, sem ceder diante das ofertas de consolo dos compradores de consciências. Não ouçam as palavras doces com as quais querem abrandá-las os pregadores das reconciliações indignantes. Que nunca se detenham em seu obstinado lamento, essa desbocada exigência de vida, essas voltas intermináveis nas praças dos povoados; que não se cale esse clamor de justiça que se levanta desde o início dos séculos e chega até hoje, para que o império nunca durma sem sentir, mesmo tampando os ouvidos, que seus massacres não caíram no esquecimento.” (Néstor Míguez)

Feliz Natal e Feliz Ano Novo cheio de vida, de clamor e de esperança!

Inscrições abertas para curso de férias “Diversidade religiosa em sala de aula”

O curso de extensão universitária “Diversidade religiosa em sala de aula” está com as inscrições abertas. Este curso é coordenado pelo Coletivo por uma Espiritualidade Libertária em parceria com o Complexo Educacional FMU (São Paulo).

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O curso é voltado para professores e demais profissionais da educação básica e comunidade, mas aberto a interessados em geral, graduados e graduandos em qualquer área. Serão 5 módulos (20h) com 5 encontros presenciais (aos sábados das 8h00 às 12h00: 20/1, 27/1, 03/2, 17/2, e 24/2) mais leituras e atividades a distância. As vagas são limitadas.

O primeiro encontro presencial será no dia 20 de janeiro (sábado) a partir das 8h00, no Centro de Pós-graduação do Complexo Educacional FMU, localizado na Rua Vergueiro, 107, Liberdade (próximo ao metrô São Joaquim), aqui na cidade de São Paulo. Compareçam!

  • Módulo 1: Diversidade religiosa e direitos humanos
  • Módulo 2: Intolerância religiosa no Brasil e em sala de aula
  • Módulo 3: Elementos para promover e valorizar a diversidade religiosa
  • Módulo 4: Diversidade religiosa nos materiais didáticos e objetos de aprendizagem
  • Módulo 5: Diversidade religiosa no planejamento das aulas

Veja o folder com maiores informações sobre o curso.

Inscrições:
https://fmu.educaz.com.br/curso/diversidade-religiosa-em-sala-de-aula
Tel.: 11 3132 3000

Informações (sobre este curso, e sobre palestras e oficinas): espiritualidadelibertaria@gmail.com

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O Coletivo por uma Espiritualidade Libertária lançou o primeiro número do informativo “Diálogos & Espiritualidade” (2017) que aborda a questão da intolerância religiosa. Esta publicação está no âmbito das atividades da Campanha Contra a Intolerância Religiosa e do projeto “Diversidade religiosa em sala de aula”. Para saber mais sobre a Campanha Contra a Intolerância Religiosa, leia o texto “É preciso dizer não à intolerância religiosa no Brasil” de Amauri Alves e Silas Fiorotti. E para saber sobre o projeto “Diversidade religiosa em sala de aula”, leia o texto “Por que falar de religião em sala de aula?” de Silas Fiorotti.

No dia 29 de abril, ocorreu o Diálogo sobre as perspectivas das teologias feministas

No dia 29 de abril, ocorreu o “Diálogo sobre as perspectivas das teologias feministas“, aqui na cidade de São Paulo. Este diálogo contou com a participação de Elaine Donda (teóloga e pesquisadora da Umesp) e de Mabel Garcia (teóloga e pastora batista) e a mediação de Angélica Tostes.

Nós, do Coletivo por uma Espiritualidade Libertária, agradecemos a todas e todos que colaboraram e participaram desse encontro.

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(fotos de Elaine Donda e Angélica Tostes)

Lembramos que estão abertas as inscrições para o curso de extensão “Diversidade religiosa em sala de aula”, coordenado pelo Coletivo por uma Espiritualidade Libertária, que será ofertado na Pós-graduação da FMU, com aulas aos sábados pela manhã, na cidade de São Paulo. Para saber sobre o projeto “Diversidade religiosa em sala de aula”, leia o texto “Por que falar de religião em sala de aula?”.

Contato: espiritualidadelibertaria@gmail.com.

“Ser de candomblé é assumir o risco de ser discriminado o tempo todo”, entrevista com Patrício Carneiro Araújo

Entrevista com Patrício Carneiro Araújo (“Odé Nisojí n’Egbé Irê-Ô”), concedida a Silas Fiorotti, membro do Coletivo por uma Espiritualidade Libertária, no dia 31 de janeiro de 2017, dentro das atividades da Campanha Contra a Intolerância Religiosa (2017) e do projeto “Diversidade religiosa em sala de aula”.

Há quanto tempo você é candomblecista? O que é ser um candomblecista para você?

Conheci o candomblé no ano 2000, virada de século. Porém, meus primeiros contatos mais profundos com o candomblé se deram, em 2001, em João Pessoa, na Paraíba. Lá conheci o mundo dos terreiros, das nações de candomblé e dos orixás. Foi amor à primeira vista. No primeiro contato que tive com um terreiro já percebi que ali era meu lugar no mundo. Naquele mesmo ano, estive pela primeira vez diante do oráculo sagrado (jogo de búzios). No mesmo dia que o Pai Buiú de Oyá Onira jogou pra mim, fui a uma festa de Oxum (Ipeté) na casa da Mãe Chaguinha de Oxósse onde, pela primeira vez tive a honra de sentir no meu corpo a energia do meu orixá (Odé). Foi ali que comecei a entender o que é ser de candomblé. Em 2003, vim viver em São Paulo, onde, em 2007, me iniciei como filho de Odé Irinlê (Oxósse), na nação Ketu. Este ano (2017) completo, com muita honra e gratidão, 10 anos de iniciado. Sou filho do Pai Daniel Oguntobi, babalorixá n’Egbé Ire-ô, Diadema, São Paulo. Tenho então 17 anos de candomblé e 10 anos de iniciado.

Para mim, ser candomblecista é ter a consciência de que o ser humano realmente é um ser para a transcendência. É saber que a pessoa não está sozinha no mundo e que cada partícula da natureza, desde as folhas de uma planta até a poeira cósmica, compõem uma mesma realidade sagrada e sacralizante. Ser candomblecista é saber que o ser humano é imortal através da memória do seu povo e do seu grupo. Ser de candomblé é perceber-se como parte da divindade que dá vida e que mantém a vida de tudo que é animado e inanimado. Mas ser candomblecista também é ter consciência de que será vítima do racismo, discriminação e rejeição por parte da sociedade na qual vivemos. Ser de candomblé é perceber-se como parte de um povo mal compreendido que luta todo dia para provar ao mundo que não cultua o demônio e não faz mal às pessoas. Então, ser candomblecista é mais do que ser um religioso ou seguidor de uma religião: é assumir uma postura política diante do mundo. Para cultuar seu orixá, nkisi, vodum, etc., é preciso assumir uma posição política no sentido de defender aquilo que há de mais precioso para qualquer pessoa: sua consciência de sagrado.

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Você já sofreu algum tipo de preconceito por conta da sua fé?

Várias vezes. Aqui faço questão de relembrar meus primeiros contatos com o preconceito, discriminação e racismo contra o mundo dos terreiros. Lembro-me que na minha infância, no povoado de Palmeira, Município de Imaculada, Paraíba, na década de 1980, a única religião que conhecíamos era o catolicismo. A Igreja praticamente mandava em tudo e em todos. Naquela época, duas umbandistas daquele povoado, depois de viverem no sudeste voltaram pra lá levando a umbanda. Lembro-me bem da intolerância que tiveram que enfrentar. Para manter a memória, faço questão de lembrar o nome de uma delas: Dona Maria Balá. Esta senhora sempre teve que morar em um sítio longe do povoado (cujo nome, Crioulos, me leva a pensar que ali um dia pode ter existido um quilombo). E sempre que vinha ao povoado, para as feiras ou outros compromissos, era evitada por grande parte das pessoas. Muita gente tinha medo dela e a evitava. Era vista como uma pessoa perigosa só pelo fato de ser umbandista. Tempos depois teve que ir morar em outra cidade. A pressão era muito grande. A outra umbandista nem lembro o nome. E isso é sintomático. Lembro que era parente de uma professora do lugar, Iraci. Mas, essa umbandista logo teve que se mudar também. O preconceito, racismo e intolerância religiosa a impediram de permanecer morando lá.

No meu caso, já vivi diversas situações de preconceito e intolerância por motivação religiosa. Inclusive na minha família. Lembro-me que minha mãe biológica, que não entende nada de candomblé e acha que é coisa do demônio, uma vez ameaçou de me abandonar, caso eu me iniciasse no candomblé. Noutra ocasião, uma irmã biológica, a quem amo muito e que sempre me acolheu na sua casa, tempos depois que eu me iniciei precisei passar uma temporada morando na casa dela. Mesmo me acolhendo de pronto, discretamente me sugeriu que, caso eu fosse realmente morar lá, evitasse levar as coisas de orixá: “Não por nós, mas, por causa dos vizinhos”, se justificou. De outra vez, andando  de roupa branca (preceito recomendado aos iniciados nos dias de sexta-feira ou em períodos de ritualizações) pelas ruas do meu bairro, ao passar diante de um posto de combustíveis ouvi um frentista esconjurar o demônio atrás de mim. Acho que não preciso dizer que, naquela ocasião o demônio era eu. Em outra ocasião, por estar vestido de branco, usando torço (indumentária religiosa utilizada para cobrir a cabeça sacralizada) e fios de contas (colares sagrados que identificam os orixás) ao entrar em um ônibus e sentar numa poltrona do lado de uma senhora, esta se levantou e preferiu seguir viagem em pé, longe de mim. Situações como essas são comuns no cotidiano de pessoas ligadas ao candomblé e às outras religiões afro-brasileiras. Desafio um frequentador de terreiros que não tenha uma coleção de casos semelhantes. Por isso falo que ser de candomblé é assumir uma postura política diante do racismo, preconceito e discriminação. Ser de candomblé é assumir o risco de ser discriminado o tempo todo, inclusive por seus familiares que não são desse meio.

“Ser de candomblé é assumir uma postura política diante do racismo, preconceito e discriminação. Ser de candomblé é assumir o risco de ser discriminado o tempo todo, inclusive por seus familiares que não são desse meio.” (Patrício Carneiro Araújo)

Você fez uma pesquisa sobre a intolerância religiosa nas escolas. Como a intolerância religiosa se manifesta na educação básica? Essa intolerância religiosa vem acompanhada com outros preconceitos?

Na educação básica a intolerância religiosa se manifesta de muitas formas. De forma institucional, quando a escola elabora currículos intolerantes e racistas que só privilegiam os conteúdos ligados às culturas hegemônicas e aos grupos que se mantêm há séculos no poder. Quando professores e gestores colocam suas crenças pessoais e idiossincrasias à frente das suas ações profissionais, promovendo quem crê como eles e discriminando, ou mesmo demonizando, quem crê de outra forma. Quando os materiais didáticos privilegiam uma cultura religiosa hegemônica e silencia sobre as religiões dos grupos historicamente discriminados. Quando a formação dos professores reproduz preconceitos, discriminações, estereótipos e erros acerca das religiões minoritárias. Quando as Secretarias de Educação e Diretorias de Ensino se transformam em púlpito a serviço de religiosos fundamentalistas que ocupam cargos e funções administrativas, etc. No plano das relações mais diretas e imediatas, a intolerância religiosa também se manifesta na educação básica toda vez que uma criança é xingada por ser de terreiro; sempre que amizades se desfazem quando um dos amigos fica sabendo que seu colega, com quem conviveu harmonicamente durante anos, é de terreiro; quando, durantes as aulas e atividades, professores fundamentalistas reafirmam, diante de seus alunos, que macumba é coisa do diabo e que quem é de candomblé não vai pro céu e não se salvará; sempre que símbolos de religiões minoritárias são vilipendiados, rejeitados, proibidos etc., enquanto os símbolos das religiões majoritárias são acolhidos, promovidos, exaltados e impostos. Por exemplo, toda vez que um crucifixo é afixado à parede da escola, enquanto o fio de contas no pescoço da criança de candomblé é desqualificado, a intolerância religiosa está acontecendo. Em todas essas situações, e em muitas outras, a escola está reforçando o racismo e a intolerância. E, por isso mesmo, está traindo sua verdadeira natureza e função. Uma escola racista e intolerante é uma escola traidora.

“Toda vez que um crucifixo é afixado à parede da escola, enquanto o fio de contas no pescoço da criança de candomblé é desqualificado, a intolerância religiosa está acontecendo.” (Patrício Carneiro Araújo)

Nesse sentido, a intolerância religiosa é um tipo de violência que sempre vem acompanhada de outras: machismo, homofobia, racismo, agressão, desrespeito, etc. Afinal, na maioria dos casos, os agentes da intolerância religiosa são pessoas fortemente apegadas a suas concepções religiosas fundamentalistas. Contudo, nunca se pode perder de vista que a intolerância religiosa é uma forma de racismo. Racismo e intolerância religiosa são irmãos siameses. E por isso mesmo devem ser consideradas como um crime contra a humanidade. Intolerância religiosa não é brincadeira e nem mal entendido: é crime. E como crime deve ser denunciada, combatida e punida.

Mesmo sendo evangélico, sei que nós evangélicos temos muita responsabilidade pela intolerância religiosa contra adeptos das religiões afro-brasileiras. Você pode passar alguma mensagem aos evangélicos que não conhecem as religiões afro-brasileiras e seus adeptos?

Se eu tivesse a oportunidade de dar um conselho aos evangélicos fundamentalistas e intolerantes eu lhes aconselharia ir ler os evangelhos. Lhes recomendaria reler o Sermão da Montanha. Creio que os setores evangélicos fundamentalistas (que infelizmente não são poucos) não entenderam nada da mensagem evangélica. Diz-se que, uma vez indagado sobre por que não se convertia ao cristianismo, Gandhi afirmou que seu problema não era o cristianismo e sim os cristãos. Não se tem conhecimento de que Jesus defendesse a violência e a intolerância. Salvo engano, as únicas pessoas que despertaram a raiva de Jesus foram os fariseus, a quem ele chamou de “sepulcros caiados”. Sendo assim, aos evangélicos intolerantes e violentos eu aconselharia fazerem um exame de consciência sincero, a fim de investigarem até que ponto não estão sendo os sepulcros caiados de quem o Mestre de Nazaré falou.

Há quem diga que a intolerância é filha da ignorância e que só existe entre aqueles que não conhecem as outras religiões. Discordo disso. Há muita gente que mesmo conhecendo discrimina. Conhecer não é suficiente para respeitar. Para que se respeite é preciso ser honesto. Sendo assim, aos evangélicos intolerantes eu também recomendaria uma boa dose de honestidade. O evangélico honesto não discrimina. Não é intolerante. Não reproduz discurso de ódio. O evangélico honesto até prega o Evangelho para o membro de outra religião, mas nunca o agride. Sempre o respeita. Nem todo evangélico é intolerante. Então, podemos afirmar que é possível conviver com o outro sem agressão e respeitando-o. Qual o mal em falar da sua religião para membros de outras religiões? Nenhum. O problema começa quando a desonestidade passa à frente do sentimento de fé verdadeira. Aí o discurso de ódio assume o lugar da sinceridade de fé. Então não resta outra opção: os evangélicos têm que voltar a ler os evangelhos e tentar compreender sua mensagem. Quando a compreenderem de fato, verão que lá não há espaço para a intolerância, o ódio e a violência.

Outra recomendação aos evangélicos que lerem essas simples palavras é que procurem conhecer melhor as religiões afro-brasileiras. Àqueles que assim o desejarem convido a visitar um terreiro. Se aceitarem meu convite verão que essas religiões não adoram o diabo e não fazem mal às pessoas. Verão também como o povo de terreiro é feliz e jamais desrespeita o sagrado do outro. Da mesma forma, ao visitar um terreiro verão os valores cultivados pelo povo de santo e como viver é leve quando um se preocupa e cuida do outro como se fosse parte da divindade cultuada. Verão também como a natureza é reverenciada como parte da criação de Olorum (Deus). E, por fim, verão que o sentido da vida está no amor e não no ódio.

Suponho que você possua amigos e familiares que também são evangélicos. Agora no sentido de quebrar estereótipos, você pode citar algum aspecto que você considera positivo relacionado aos evangélicos?

Sim, com certeza tenho muitos amigos evangélicos. E também tenho muitos membros da minha família que são evangélicos. Tenho irmão que é diácono da Assembleia de Deus. Tenho um profundo respeito por eles e, da mesma forma, sempre fui muito respeitado. Naturalmente há aqueles que em vez do diálogo preferem o silêncio, quando o assunto é religião. Quando isso acontece respeito o silêncio deles e nos comunicamos através do respeito ao silêncio um do outro. Mas, no geral, todos me respeitam como candomblecista. E alguns até aproveitam para tirar dúvidas e conhecerem melhor a forma de crer e viver do povo de terreiro. Dessa forma, entre os muitos aspectos positivos que percebo nesses evangélicos, com os quais convivo, destaco o esforço em respeitar o outro, o profundo senso de reverência ao sagrado e às sagradas escrituras, o cuidado com a família, a valorização do trabalho, o zelo pela sacralidade da vida, a solidariedade e o desejo de fazer as coisas certas. Todos esses valores, e muitos outros, percebo nos evangélicos com os quais convivo. Da mesma forma, esses mesmos valores também podem ser percebidos entre o povo de terreiro. Então, se temos tanto em comum, por que não nos respeitarmos?

“Entre os muitos aspectos positivos que percebo nesses evangélicos, com os quais convivo, destaco o esforço em respeitar o outro, o profundo senso de reverência ao sagrado e às sagradas escrituras, o cuidado com a família, a valorização do trabalho, o zelo pela sacralidade da vida, a solidariedade e o desejo de fazer as coisas certas.” (Patrício Carneiro Araújo)

Agradecemos por essa entrevista.

Agradeço o convite para essa conversa e novamente reafirmo que o remédio contra o ódio é o amor. E, se uma religião não ensina a amar não faz sentido existir. Mas, esse amor de que falo não é o amor egoísta e narcísico que só ama o semelhante. Falo do amor que Jesus ensinou e que Oxalá ensina: o amor incondicional. Afinal, como o próprio Jesus falou: “Com efeito, se amais aos que vos amam, que recompensa tendes? Não fazem também os publicanos a mesma coisa? E se saudais apenas os vossos irmãos, que fazeis de mais? Não fazem também os gentios a mesma coisa? Portanto, deveis ser perfeitos como vosso Pai celeste é perfeito” (Mateus 5, 46-48).

Axé!

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Patrício Carneiro Araújo (“Odé Nisojí n’Egbé Irê-Ô”) é doutor em Ciências Sociais pela PUC-SP. E-mail: patricio.carneiroa@gmail.com.

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O Coletivo por uma Espiritualidade Libertária (de São Paulo) aceita convites para palestras voltadas para jovens, estudantes, educadores e religiosos. Entre em contato conosco para levar alguma palestra para sua instituição, empresa, escola, igreja, grupo de jovens ou coletivo. Para saber mais sobre a Campanha Contra a Intolerância Religiosa, leia o texto “É preciso dizer não à intolerância religiosa no Brasil” de Amauri Alves e Silas Fiorotti. E para saber sobre o projeto “Diversidade religiosa em sala de aula”, leia o texto “Por que falar de religião em sala de aula?” de Silas Fiorotti.

Contato: espiritualidadelibertaria@gmail.com.

Enfrentando o preconceito como alternativa para a promoção da saúde (por Eugênia Zilioli Iost)

O trabalho da Atenção Básica de Saúde (Setor Público) no Brasil enfrenta vários desafios para promover uma população saudável. A UBS (Unidade Básica de Saúde) é a porta de entrada principal para os munícipes iniciarem as investigações das queixas físicas e mentais, aumentando com isso a complexidade no trabalho dos profissionais de saúde.

A visão que temos sobre a Saúde de uma população incide diretamente no processo de trabalho dos profissionais. De acordo com a linha teórica da Saúde Coletiva, os aspectos que podem influenciar no processo Saúde-Doença não são exclusivamente biológicos, a maneira como a sociedade se organiza, socialmente, economicamente e culturalmente, tem uma atuação potencialmente elevada no desenvolvimento das doenças.

Com base nessa teoria, a UBS Alpes do Jaraguá, no município de São Paulo, desenvolveu um projeto intitulado de “Alpes Diversidade”. Este projeto, pretende ampliar a visão de mundo dos profissionais de saúde e demais trabalhadores da Unidade (Segurança, Limpeza, Administrativo), sobre assuntos ligados aos direitos humanos. Em março de 2015, iniciamos rodas de conversa com todos os trabalhadores da UBS, sendo o primeiro tema “Racismo no Brasil”. O segundo tema deste projeto foi a “Intolerância Religiosa às religiões de matrizes africanas”.

Durante as rodas de conversa, contamos com um professor de filosofia que é líder no Candomblé e isso permitiu um aprofundamento sobre o assunto. Apresentamos também um documentário da ONU Brasil sobre o preconceito às religiões de matrizes africanas (ou religiões afro-brasileiras) no Brasil. Durante o debate, os participantes (principalmente cristãos), questionaram sobre os símbolos dessas religiões serem semelhantes à imagem do “demônio” e que se sentiam “mal” quando assistiam aos seus rituais. Estes apontamentos foram fundamentais para que a equipe condutora do Projeto pudesse esclarecer sobre as diferenças entre os símbolos religiosos e os seus significados nas religiões de matrizes africanas.

Foi possível também abordar sobre o modelo eurocêntrico, imposto ao Brasil desde a sua colonização e que o olhar sobre um culto religioso necessita de uma base cultural alinhada à religião específica.

Como gerente dessa UBS, pude observar que essas rodas de conversas, impulsionaram uma reflexão sobre os modelos e conceitos fundamentalistas da nossa sociedade, vários funcionários comentam que hoje estão vendo, por exemplo, as cotas raciais de outra maneira, pois entenderam que desde a libertação dos escravos esta foi a primeira ação de inclusão do negro no sistema de educação.

Esse projeto tem permitido evidenciar que é possível organizar um ambiente propício para a reflexão de temas inclusivos e que não importa onde estamos ou o que fazemos, o fundamental é sairmos da posição de expectadores e atuarmos como protagonistas das nossas vidas.

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Eugênia Zilioli Iost é gerente da UBS Alpes do Jaraguá, mestre em Enfermagem em Saúde Pública, e membro do Coletivo por uma Espiritualidade Libertária. E-mail: eugeniazilioli@yahoo.com.br.

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O Coletivo por uma Espiritualidade Libertária (de São Paulo) também aceita convites para palestras voltadas para jovens, estudantes, educadores e religiosos. Entre em contato conosco para levar alguma palestra para sua instituição, empresa, escola, igreja, grupo de jovens ou coletivo. Para saber mais sobre a Campanha Contra a Intolerância Religiosa, leia o texto “É preciso dizer não à intolerância religiosa no Brasil” de Amauri Alves e Silas Fiorotti. E para saber sobre o projeto “Diversidade religiosa em sala de aula”, leia o texto “Por que falar de religião em sala de aula?” de Silas Fiorotti.

Contato: espiritualidadelibertaria@gmail.com.